O espaço resulta da união da Casa do Cante, que conta com um centro documental, uma galeria de exposições e um pequeno auditório, e o recém-criado Centro Interpretativo do Cante Alentejano. Este último é a “novidade”, que tem como objetivo dar a conhecer o Cante e permitir uma experiência, nesse campo, a quem o visita.
O Museu do Cante em Serpa é uma das “principais ferramentas no trabalho de salvaguarda e transmissão do cante”, sendo de extrema importância para o género musical e para o Alentejo em geral, garante o presidente da Câmara de Serpa, Tomé Pires, explicando que o espaço, recentemente inaugurado, surge na continuação da Casa do Cante – criada após a candidatura que levou à classificação do Cante Alentejano como Património Cultural Imaterial pela Unesco –, que já tinha “as valências de um centro documental, uma galeria de exposições e um pequeno auditório”, a que se junta agora o centro interpretativo.
Tomé Pires diz o projeto “tem como objetivo maior dar a conhecer o Cante e oferecer ao visitante uma experiência neste campo”. O projeto de museografia do novo equipamento foi desenvolvido pelo município e tem a parceria da Direção Regional da Cultura do Alentejo.
Os conteúdos contam a história do Cante desde a sua génese até ao presente, e estão disponíveis em suporte físico e digital, tendo “partes mais interativas e mais dinâmicas” para aproximar o visitante “da experiencia” do género musical tradicional alentejano. O destaque vai para “a ‘box’ do cante”, um miniestúdio onde os visitantes podem “experienciar” a sensação de estar “no meio de um grupo coral e cantar,” ficando a audição registada.
Paulo Lima, o antropólogo que trabalhou os conteúdos, diz que o mais importante da ‘box’ é a “possibilidade de deixar uma memória”. Ou seja, “[o visitante] poder cantar ou dar um testemunho sobre a história do Cante, servindo como um arquivo de memória”. Esclarece: “Estamos a potenciar que todas as pessoas possam partilhar para o presente e para o futuro uma memória sobre o Cante, seja ela pessoal ou de pessoas que conheceram ligadas a ele. Isto é relevante para a história do Cante que é urgente fazer”.
No novo museu são reveladas muitas novidades e curiosidades, como o facto de o Cante ter sido “acompanhado por instrumentos musicais” até à II Guerra Mundial. “Uma das coisas que a exposição quer mostrar, de uma forma crítica, é a transformação do Cante até aos dias de hoje”, sublinha o antropólogo, um dos responsáveis pela candidatura a Património da Humanidade.
Ainda sobre a sua história, dá conta que a partir de 1946/1947, os grupos corais, como “hoje os conhecemos”, foram formados em Beja por um conjunto de homens “reconhecidos”. Um deles, governador civil à época, teve a ideia dos encontros de grupos corais, onde definem “como cantam e como se apresentam”, construindo aquilo que nos nossos dias entendemos como Cante Alentejano, e tendo-lhes retirado um conjunto de práticas.
Segundo Paulo Lima, o Cante “é algo que se foi transformando continuamente”, e com que as pessoas se foram identificando, continuando a reconhecê-lo como uma prática viva. Mais ainda: “A par de ser um organismo vivo, que se vai transformando e criando respostas para aquilo que é o desafio do seu contexto, ainda continua a ter em si pequenas arqueologias muito interessantes”
Outra novidade: os visitantes do museu podem aceder a uma coleção de registos de áudio desde os anos 30 do século passado. Através dessa coleção, são desvendadas “algumas coisas curiosas”, nomeadamente ficar a saber-se que o Cante “é uma prática que esteve ligada ao baile, aos instrumentos musicais”, refere Paulo Lima.
O presidente da Câmara de Serpa reconhece que este momento não é fácil para os grupos corais, sendo o “Cante inseparável do convívio”. A consequência imediata é a dificuldade de ensaiar e participar em espetáculos, muitos deles cancelados ou adiados por força da pandemia. Prever mais longe “seria especular”.
“Não se pode garantir que nenhum grupo possa desaparecer, pode acontecer, como também aconteceu aparecer um novo grupo” durante este período. De acordo com Tomé Pires, a Casa do Cante e agora também o Museu do Cante têm vindo a manter “contacto telefónico permanente com todos os grupos, de forma a acompanhá-los, incentivá-los, e para os fazer sentir que não estás sós”. Com base nestes contactos, assegura que os grupos corais “têm imensa vontade de voltar a cantar e ensaiar”.
Diz o autarca que está em preparação uma avaliação do impacto a curto prazo da pandemia da covid-19 no Cante, “quando baixar a poeira”. Essa avaliação, acrescenta Paulo Lima, poderá começar a ser feita já em outubro, quando pretende promover um grande encontro de grupos corais e de bandas filarmónicas, das quais está também a preparar a candidatura a Património da Humanidade.
A construção do novo equipamento representou um investimento de 350 mil euros, cofinanciado em 85 por cento pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, através do programa Alentejo 2020.
Fonte: Diário do Alentejo