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Sexta-feira, Novembro 22, 2024

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Calor no Alentejo é vivido de forma diferente

Impala

Paulo Tavares é o autor do blog “Há em Nós Qualquer Coisa”, onde escreve sobre o quotidiano do povo alentejano e, recentemente, publicou um texto que demonstra que, no Alentejo, o calor é vivido de uma forma diferente.

O autor começa o texto dizendo que “O sol na nossa terra derrete tudo num lânguido, seco e desumano dia de verão. Lembro-me bem de andar pelas ruas do meu bairro-vida e sentir alcatrão em barro pronto a moldar por baixo dos chinelos de enfiar no dedo, como se nos preparasse o chão para nos engolir lentamente, ou não estivéssemos nós no Alentejo”.

Segundo Paulo, o alentejano “nasceu com isto, mas não para isto”. “A nossa humanidade torna-se um pouco mais efémera a cada raio que não dá tréguas. A sombra é refúgio, por mais ínfima que seja. Plátano imponente, sobreiro jovem, muro desconchavado, todo e qualquer sítio onde se possa respirar fundo, piscar um olho, meter uma mão por cima da testa e arrepiar caminho até ao próximo apeadeiro solar.”, refere.

Paulo tavares conta ainda algumas das tradições dos alentejanos, que ganharam mais significado com os dias de calor. O autor do texto refere que que o alentejano traz sempre consigo um lenço no bolso “salvador de buços e nucas empestados de suor de trabalho”. A boina “sai e o enxugamento do líquido acre e salgado inicia-se sem pressas, pois o mais certo é fazer falta dali a poucos minutos.”

De acordo com o mesmo “O calor é inexorável, não dá tréguas. Nas horas em que se sente em maior força, regula um recolher obrigatório para pousio munido de água ou groselha fresca, gaspacho com pedras de gelo, tomate e vinagre. O calor suporta-se em silêncio, imóvel, tornando a maior região do país no mais completo museu vivo do mundo durante algumas horas todos os dias.”

“À medida que o dia se vai fechando e as longas noites de fim de agosto irradiam luas meio escondidas por areias de outros continentes, o Alentejo vai ganhando vida, pouco a pouco, saindo cada um dos seus habitantes dos seus casulos térmicos. Mas continua quente, dirão os mais incautos. Sim, dias de quarenta e muitos graus ninguém aguenta. Mas noites de trinta promovem a socialização dos vizinhos confinados que falam do nada que é tudo nas suas vidas, incentivam às gargalhadas de voz cheia nas esplanadas de bairro, entre tilintares de copos e chávenas, agrupam jovens em caminhadas intermináveis pelas mesmas ruas, irradiando vida pelos prédios de luzes apagadas e janelas abertas, de toalhas molhadas no chão de varandas.”, acrescenta.

Como conta Paulo Tavares, viver no calor “lânguido, seco e desumano é amor e sofrimento em partes iguais. Daí o ser alentejano seja também partes unânimes de carinho, saber receber, saber estar, mas também de ruas vazias, de almas escondidas por trás de cortinados de renda.”

O autor do blog deixa ainda um sábio concelho àqueles que sofrem mais com o calor, dizendo que “O Alentejo no verão é tudo isto e muito mais. Mas se fecharem os olhos e uma onda de calor vos fizer chorar de transpiração e lá ao fundo ouvirem apenas as inabaláveis cigarras em cacofonia sem fim, protejam-se do sol e voltem mais à noitinha.”

 

Fonte: Há em Nós Qualquer Coisa

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