A Direção Regional de Cultura do Alentejo (DRCA) determinou a suspensão de intervenções no terreno e a avaliação do estado em que ficaram os vestígios arqueológicos do povoado de fossos pré-históricos afetado por trabalhos agrícolas em Beja.
Trata-se do povoado Salvada 10, que está situado junto à aldeia de Salvada, no concelho de Beja, e, segundo o Movimento Chão Nosso, que denunciou o caso na passada quarta-feira, “é um dos maiores recintos de fossos pré-históricos conhecidos no Baixo Alentejo”.
Em reposta a perguntas colocadas pela Lusa, a diretora regional de Cultura do Alentejo, Ana Paula Amendoeira, refere que a instituição, em articulação com a Câmara de Beja, “estabeleceu a suspensão de qualquer tipo de intervenção” no terreno e “determinou a realização de trabalhos” para “apurar com precisão a circunstância e a caracterização dos vestígios arqueológicos afetados” por operações de ripagem para instalação de um olival.
As medidas “resultam da imposição consagrada” no Plano Diretor Municipal (PDM) de Beja e, nos termos da lei, deverão ser suportadas pelos promotores do projeto agrícola, refere.
Segundo a responsável, a DRCA “encetou de imediato” aquelas “diligências cautelares necessárias”, porque, “é essencial uma aferição mais precisa que permita determinar os trâmites adequados”.
“No acompanhamento e no desenvolvimento dos dados que venham a ser apurados, serão consideradas, a seu tempo, outras medidas e ações, nomeadamente a imputação das eventuais responsabilidades contraordenacionais e/ou criminais”, disse.
Ana Paula Amendoeira contou que a DRCA teve conhecimento da situação de afetação do povoado por trabalhos agrícolas através de uma denúncia anónima, tendo deslocado “de imediato”, no dia 15 deste mês, dois arqueólogos da instituição acompanhados por um técnico da Câmara de Beja.
A deslocação permitiu perceber que, sem ter sido feita qualquer ação de salvaguarda do património, foram realizadas operações de ripagem numa área situada no lado a nascente da pequena linha de água – o barranco do Sardão – que divide a extensa área arqueológica do povoado e para preparação de terras para instalação de um olival, “tendo sido observado os terrenos já gradados”.
“Tal resulta de um incumprimento do regulamento do PDM de Beja”, o qual estabelece que os vestígios do Salvada 10 têm “valor arqueológico elevado” e, por isso, qualquer tipo de intervenção na zona relacionada com infraestruturas, incluindo as de rega, operações urbanísticas e atividades agrícolas e florestais, “deve ser precedido de trabalhos arqueológicos prévios de caracterização e diagnóstico (sondagens/escavações) que promovam a adequação das soluções propostas ao valor científico e patrimonial dos bens”.
Por tal não ter sido feito, “resultaram indícios de afetações patrimoniais, cujo grau carece de ser averiguado”, indica, referindo que já foram feitas “observações superficiais de materiais fragmentados e revolvidos”, mas ainda não foi possível “determinar o grau de afetação e em que estado ficaram as zonas afetadas”.
Segundo a responsável, o Salvada 10 corresponde a um grande povoado de época calcolítica com recintos de fossos, sobranceiro ao barranco da Salvada e atravessado a Norte-Sul pelo barranco do Sardão.
Trata-se de uma “extensa mancha” de ocupação do 3.º milénio A.C. e com vestígios igualmente do 2.º milénio (Calcolítico/Idade do Bronze) e que abarca, no interior, outras realidades arqueológicas, como a presença de vestígios da Idade do Ferro e de uma área de ocupação romana.
“Através das observações de superfície, constata-se que as afetações incidem em níveis de ocupação romana”, mas “não foi possível observar a dimensão das afetações que as ripagens poderão ter causado no povoado pré-histórico delimitado por fossos subjacentes à ocupação romana”, explicou a responsável.
O povoado Salvada 10, que foi detetado em 2012 durante a realização de um estudo de impacto ambiental para a Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva, já tinha sido afetado em 2017 por trabalhos agrícolas para instalação de um outro olival e numa área a poente do barranco do Sardão.
As afetações em 2017 levaram à implementação de medidas de avaliação e de trabalhos de minimização dos danos decretados pela DRCA.
A DRCA, em colaboração com a Câmara de Beja, identificou os proprietários e o arrendatário do terreno e promotor das recentes operações de ripagem no povoado, “não havendo, com os dados disponíveis, correspondência” com o promotor das afetações registadas em 2017, disse Ana Paula Amendoeira.