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Quinta-feira, Setembro 19, 2024

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Os Chocalhos de Alcáçovas: Um testemunho vivo da herança cultural do Alentejo.

A produção de chocalhos em Portugal, especificamente no distrito de Évora, mantém-se viva na pequena localidade de Alcáçovas, no concelho de Viana do Alentejo. Esta atividade artesanal, que se desenvolve em círculos familiares restritos, remonta a 1375, quando as primeiras regulamentações sobre o uso de chocalhos nos animais foram introduzidas nas Posturas da Cidade de Évora. O fabrico de chocalhos em Alcáçovas está documentado desde 1439, quando os mestres chocalheiros se organizaram na Casa dos Vinte e Quatro, em Évora.

Desde dezembro de 2015, a arte chocalheira já é reconhecida como Património Cultural Imaterial com Necessidade de Salvaguarda Urgente pela UNESCO. Este título sublinha a importância desta tradição, destacando-a como uma herança cultural única que merece proteção e valorização. A candidatura foi considerada exemplar, sendo aprovada em poucos minutos e sem qualquer objeção, refletindo o valor intrínseco desta prática secular.

Durante o final do século XIX, a produção de chocalhos continuava a florescer em Alcáçovas, com dez oficinas ativas em 1890 e dezassete famílias dedicadas a esta indústria em 1913. A importância desta arte manteve-se até aos dias de hoje, com várias oficinas ainda em funcionamento. Quando o Gabinete do Artesanato Regional do Distrito de Évora (G.A.R.D.E.) foi criado em 1963, algumas das oficinas que ainda hoje são lembradas estavam ativas, como as de António Grosso Sim-Sim, João Chibeles Penetra e Joaquim Firmino da Silva Sim-Sim, entre outros.

O espólio do Centro de Artes Tradicionais inclui uma vasta coleção de chocalhos, cada um com características únicas. Por exemplo, um chocalho cilíndrico de tipo estreito, geralmente usado para ovelhas, destaca-se pelo seu design em chapa de ferro acobreado e o badalo de metal cuidadosamente ajustado. Outro exemplo é o chocalho de tipo reboleiro, originário de Alcáçovas, que apresenta um acabamento polido e um badalo de madeira, fixado com uma fita de cabedal.

A tradição de fabrico de chocalhos é mantida viva através de sessões de artesanato ao vivo, onde estas peças continuam a ser produzidas utilizando técnicas ancestrais. Um dos processos fundamentais é o de “embarrar” o chocalho, que envolve a aplicação de uma mistura de barro e moinha (palha triturada) para proteger o metal durante a soldagem. Esta técnica, que requer uma secagem cuidadosa, culmina na fusão do latão com a chapa de ferro, conferindo ao chocalho a sua cor característica e durabilidade.

João Chibeles Penetra, um dos mestres chocalheiros mais conhecidos de Alcáçovas, fundou o Museu do Chocalho na localidade e continua a ser uma figura central na preservação desta arte. As suas peças, como um chocalho embarrado dos anos 80, exemplificam o rigor e a dedicação envolvidos em cada etapa do processo, desde o corte e enrolamento da chapa até à afinação final do som.

A produção de chocalhos em Alcáçovas não é apenas uma atividade artesanal, mas um testemunho vivo da herança cultural do Alentejo. Através de cada chocalho, esta tradição secular continua a ressoar, mantendo-se como um símbolo de identidade e resiliência para as gerações futuras.

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