Os serviços de Saúde do distrito de Évora podem passar a prescrever cultura a utentes que sofrem de algumas patologias, para irem “ao teatro como quem toma um Prozac”, graças a um projeto em curso na região.
“Queremos trabalhar com os cuidados de saúde primários para que os médicos saibam que existe uma série de iniciativas”, como ‘workshops’ ou espetáculos e eventos, “que podem prescrever, literalmente, aos seus utentes”, disse hoje Ana Isa Coelho, da Comunidade Intermunicipal do Alentejo Central (CIMAC).
Este projeto de prescrição cultural, que a CIMAC diz ser “inovador” no país e inspirado em experiências semelhantes no Reino Unido e norte da Europa, integra o Transforma – Programa para uma Cultura Inclusiva do Alentejo Central.
A iniciativa, que promove a inclusão social junto de populações excluídas ou isoladas, através da cultura, prevê arrancar, em 2022, com esta prescrição cultural, a desenvolver com os cuidados de Saúde primários. Coordenado pela CIMAC, o programa, que abrange os 14 municípios de Évora, arrancou no ano passado e está em curso até março de 2023, envolvendo quase dois milhões de euros de investimento, com financiamento comunitário.
O objetivo é “experimentar processos de prescrição cultural, complementares à prescrição médica convencional e ao apoio social”, contribuindo “para a saúde e bem-estar, através de atividades que podem apoiar o processo de recuperação e integração das populações”, segundo a comunidade intermunicipal.
Ana Isa Coelho explicou que o projeto vai procurar estabelecer parcerias com os municípios e serviços de Saúde para que médicos ou psicólogos prescrevam atividades culturais “aos utentes que sofrem de alguma patologia, não apenas doença mental”.
Por exemplo, no caso de “doentes a recuperar de AVC ou com problemas respiratórios, cantar é fundamental”, pelo que o utente pode vir a ser ‘medicado’ com aulas de cante alentejano, apontou.
Ao mesmo tempo, tem que haver já “um trabalho feito com a organização cultural que ministra esse ‘workshop’ de cante”, que tem de estar capacitada “para receber estes utentes”, acrescentou.
No âmbito do projeto, é preciso “organizar e saber qual é a oferta cultural, trabalhar com estes agentes culturais e, depois, com os cuidados de Saúde”, para que “tenham conhecimento do que se passa” na região, para poderem prescrever as atividades, notou.
E, “da mesma forma que o utente toma uma caixa de medicamentos e diz que tomou”, aqui também “regressará ao médico ou ao psicólogo dizendo” que fez “o ‘workshop’, que foi muito positivo”, ou assistiu “a determinado concerto”, explicou.
A CIMAC pretende que estas redes de prescrição cultural, que vão ser elaboradas, ‘nasçam’ nos 14 municípios do distrito, mas tudo depende “da apetência e da abertura dos cuidados de saúde primários, que já estão sobrecarregados”, reconheceu Ana Isa Coelho.
A ideia é que, apesar disso, se aliem a esta “aventura” para “experimentarem a prescrição cultural, portanto, ir ao teatro como quem toma um Prozac”.
“Pensamos que isto também pode suportar estes cuidados de saúde primários a terem alternativas, porque, de facto, o Prozac não resolve tudo. Ajuda, mas há toda uma componente social e de reabilitação pessoal a que achamos que a cultura pode dar resposta”, defendeu.