A pandemia COVID-19 surgiu de forma inesperada e rapidamente se espalhou por todo o mundo, levando a que fossem tomadas medidas drásticas. Portugal não foi exceção e em março entrou em período de confinamento e Estado de Emergência só terminando em maio. Apesar do período de desconfinamento que agora se vive o medo e a desconfiança ainda prosperam e não se sabe quando chegar ao fim o momento pandémico que se vive atualmente.
Esta pandemia mundial afetou não só em termos económicos, mas também em termos de saúde mental. O período de confinamento que se viveu e a incerteza que ainda se vive fazem com muitos vejam a sua saúde psicológica afetada.
Em entrevista à RC a psicóloga clínica Marta Pamol analisa todas estas questões e consequências da COVID-19 na sociedade.
Uma das consequências da pandemia foi o agravamento de situações como a dependência da Internet, a instabilidade ao nível do emprego e até as necessidades de adaptação das escolas, tudo questões que já existiam, mas que a pandemia “veio agravar”.
Também o maior stress e ansiedade são situações que já existiam, mas que com a COVID-19 e, sobretudo, no período de confinamento se sentiram mais.
“De uma forma geral, esta situação veio trazer uma grande incerteza em relação à própria doença: o que é isto, quais os perigos, que alterações veio trazer à minha vida? Numa fase inicial foi a principal questão: o que vem a seguir? O ser humano é um ser hábitos e rotinas, precisa de uma dose de inovação, mas precisa de estabilidade, coerência, de algo que se mantenha igual nos seus dias e a pandemia veio desafiar esta questão. Os medos essenciais são relacionados com a própria vida e também com o medo de perder alguém para esta doença. Não somos só nós, mas também os nossos entes queridos, as pessoas que nos são mais próximas. A questão da instabilidade financeira e também muitas questões ao nível da família que vive confinada ao longo de 24 horas no mesmo espaço, o que não é habitual, veio trazer algum stress, conflitos e ansiedade”, explica a psicóloga.
Ainda relacionado com o período de confinamento e as dificuldades que muitas famílias sentiram na convivência 24 horas por dias, Marta Pamol afirma que “cada família é uma família”.
No entanto, a “questão de estarem todos mais próximos, traz alguns desafios. Uma família é um conjunto de indivíduos e todos vão lidar com esta pandemia à sua maneira e conflitos que já pudessem existir são sempre agravados porque a pessoa não tem um escape. Considero que em determinados casos possa ter sido uma mais valia, porque já era tão habitual queixarmo-nos de não termos tempo para os nossos e pandemia veio trazer muito isto. No entanto, também veio dificultar quando toca ao espaço individual e à necessidade de ter o próprio espaço para lidar com tudo”.
Também o teletrabalho se tornou uma nova realidade para muitos portugueses, o que veio exigir uma maior concentração e uma maior divisão entre o trabalho e o lazer. A psicóloga aconselha a que “haja o espaço de lazer em casa e que seja diferente daquele que é utilizado para trabalho, mesmo a nível dos horários é muito importante que haja uma divisão de espaço e tempo para que a mente consiga fazer esta separação. Em termos de limites, perceber que se está a trabalhar em casa e até há entidades patronais que vão sobrecarregar os trabalhadores, é importante que se tornem claro estes limites”.
Questionada sobre os sinais de que se deve procurar ajuda psicológica, afirma que “é importante o autoconhecimento”, pois assim será mais fácil entender quando há necessidade de procurar ajuda.
Marta Pamol refere ainda que “a negação é sempre um problema” e, no caso da COVID-19, essa negação pode colocar em perigo não apenas o próprio indivíduo, mas também os que estão à sua volta.
Quanto ao futuro incerto do novo coronavírus e as consequências na saúde mental, explica que a “pandemia veio exigir que continuássemos o nosso dia a dia sem termos a certeza do que vai acontecer amanhã. Inevitavelmente a melhor forma de passar por isto é aceitar a incerteza”.
Para os profissionais de saúde que lidam todos os dias com diversas situações relacionadas com a COVID-19, a psicóloga conta que são “uma classe muito afetada com a situação porque lhes é exigido não cuidar só deles próprios e da família, mas de toda a gente, o que agrava a responsabilidade e o peso. Mas é importante transmitir a ideia de que não estão sozinhos e que não há vergonha em procurar ajuda e pedir auxílio”.
Por fim, Marta Pamol deixa alguns conselhos, como “não nos isolarmos emocionalmente, não evitar pensar sobre o assunto e não achar que já acabou”.