A tradição da cerâmica em São Pedro do Corval remonta aos tempos pré-históricos, graças à existência de depósitos de argilas com caraterísticas específicas nesta zona do Concelho de Reguengos de Monsaraz, que motivaram desde sempre esta atividade.
Atualmente encontramos em São Pedro do Corval verdadeiras obras de arte, quer na forma, quer na decoração – a pintura cerâmica – feitas com um saber ancestral e uma estética caraterística da região. Aliado à experiência única de poder ver ao vivo o barro a ser moldado pelas experientes mãos do mestre oleiro na sua roda e de poder partilhar dos seus conhecimentos e vivências, São Pedro do Corval, com mais de duas dezenas de olarias em constante funcionamento é por excelência o maior centro oleiro do país e um dos maiores da Península Ibérica.
Com uma história cultural tão rica e que corre o risco de se perder por falta de oleiros, a Rádio Campanário visitou ontem a Olaria Polido e Filho, e falou com António Domingues Polido, proprietário do espaço.
António Domingues Polido é natural de São Pedro do Corval, e mesmo com 81 anos continua a trabalhar esta arte alentejana. A Olaria “é um negócio de família,” que já tem “35 anos” de existência e António Polido trabalha na olaria desde que ela existe. O senhor António referiu que é oleiro “há 66 anos”, e que a paixão pela olaria começou “quando era miúdo, tinha que aprender alguma coisa. Foi uma das coisas que pedi sempre para o meu pai me mandar ensinar, oleiro.”
Na Olaria Polido e Filho a função do senhor António é trabalhar o barro e criar as peças de cerâmica, para que, posteriormente a sua equipa de pintura as possa trabalhar. “Fazemos louça decorativa e utilitária. Esta loiça dá para as pessoas utilizarem, as pessoas é que acham que não é para usar, mas é. Podem usar no dia a dia que não tem problema. Isto é cozido duas vezes a mil graus com vidro. Eu não pinto, só faço”, destacou.
Questionado sobre o que gosta mais da sua profissão, António Polido referiu “gosto de tudo. Com 81 anos ainda aqui estou a trabalhar, não estou agora na roda porque o dia hoje está muito frio, tem havido uns dias muito maus. Agora vou almoçar e só depois do almoço é que vou trabalhar um bocadinho.”
Sobre o número de funcionário da Olaria Polido e Filho, o senhor António apontou que “agora só trabalham 3 pessoas, por causa da pandemia. Houve alturas em que estavam aí 7 ou 8 pessoas a trabalhar. Com a volta da pandemia esteve praticamente quase fechado. Não chegou a fechar definitivamente, mas esteve quase.” Destacou ainda que “houve pintoras que, naquela altura, foram para o desemprego, agora temos 3, para não estarmos hoje a trabalhar e amanhã não.”
Mesmo com os percalços da pandemia o negócio não se deixou abalar. Contudo a falta de mão de obra pode ameaçar esta arte secular. “Agora temos tanta encomenda que não damos conta disto. Temos encomendas que não somos capazes de acabar até maio. E, depois, há um problema que é falta de mão de obra. Queremos pessoas para trabalhar e não conseguimos,” apontou o senhor António.
Nesta olaria as peças são produzidas e vendidas tanto para o mercado nacional como para o mercado internacional. António Polido explicou-nos que “fazemos (as peças) para o mercado nacional.” Mas “o nosso melhor cliente é na América”. Em Portugal vendem as peças “para todo o lado,” dando como exemplo “para o Algarve, Lisboa, Porto”.
Sobre a época do ano em que há mais clientes, o senhor António explicou que “agora não tem diferença, mas quase sempre quando se vende mais é na altura do verão. Há mais turismo, começamos a vender mais porque os nossos clientes também vêm mais. De inverno fica um bocado parado, mas não temos estado parados.”
No que diz respeito ao barro e aos materiais necessário na elaboração das peças, segundo o proprietário, “o barro a maioria vem de Espanha e as tintas há muitas que também são importadas da Alemanha, mas outras compro cá.” Sobre a escolha de importar o barro, o senhor António explicou-nos que “o barro vem de Espanha que tem um bocado melhor qualidade que o português e torna-se mais económico. Fazemos milhares de peças e não se parte uma peça. Temos de recorrer onde ficamos melhor no negócio.”
Sobre a continuidade da profissão, António Polido referiu “tenho 81 anos, há de chegar a uma altura em que eu quero e não posso. Agora ainda vou dando um jeito. De um momento para o outro apaga-se, é isso que estou à espera. Há certos serviços que não sou capaz de os fazer. O que me custa mais é estar muito tempo de pé, porque já fui operado. Mas sentado ali na roda a fazer as peças estou bem o dia inteiro, praticamente quase como era antes.”
Questionado sobre quais são os processos para fazer uma peça o senhor António sublinhou desde logo que “primeiro tem que aprender porque isto é um processo que não tem curiosos.” Continuou explicando que “há certos ofícios que uma pessoa que tenha jeito, às vezes remenda qualquer coisa, mas aqui não há curiosos. Aqui se a remenda for moldar um bocado de barro à mão, fazer bonecos ou uma coisa qualquer, agora trabalhar ali na roda tem que aprender mesmo e é um bocado demorado. É preciso gostar do que está a fazer. É em todas as artes, seja no que for, se não gostar é melhor abandonar, nunca chega a ser um bom profissional.”
De acordo com o oleiro, o forno é aceso “pelo menos duas vezes por semana,” destacando que “as mesmas peças são cozinhas duas vezes. Primeiro é cozido o barro, já depois de estarem pintadas. Depois, saem cá para fora e são vidradas e são enfornadas novamente e cozidas a 1000 graus.”
Sobre a falta de mão de obra, e questionado se havia jovens a aprender, o senhor António referiu que “ninguém quer aprender. Agora ninguém quer fazer nada. Agora quando morrerem os velhos, a sorte disto não morrer tudo, é que agora já há máquinas que praticamente fazem as peças quase todas”.