A Rádio Campanário entrevistou o coordenador do projeto “TransAlentejo Walking Festival”, José Pedro Calheiros, através do qual foram criados percursos de caminhada em natureza, para todos os municípios do Alentejo, que nos revelou que “atualmente estamos com 600 inscritos, através do site, aos quais se somam os inscritos de cada um dos municípios”.
O coordenador da iniciativa, explica que “esta primeira edição tem uma adesão híbrida, ou seja, como eu costumo dizer com os técnicos municipais, é muito à portuguesa, gerimos caso a caso as pessoas que são de qualquer sítio do país”, salientando que também “temos tido muitos espanhóis que se inscrevem através do site, mas depois temos os residentes locais, que se inscrevem através dos serviços de turismo ou de desporto de cada município”.
“É esta mistura de residentes, que habitualmente caminham no seu concelho, e não querem escapara à oportunidade de participar numa atividade de caracter internacional, aos quais se juntam as pessoas que vêm de outros sítios, que acabam por conviver e por conhecer pessoas com os mesmos gostos”, explica o coordenador.
Questionado sobre o planeamento de cada caminhada, José Pedro Calheiros começou por dizer que “os percursos da rede TransAlentejo nascem de uma ideia da Entidade Regional de Turismo do Alto Alentejo, que percebeu que o território tinha que ser harmoniosamente organizado”. Pois “o «walking», assim chamado a nível internacional, é um produto turístico de grande rentabilidade”, ou seja, “em toda a Europa e na América do Norte, Estados Unidos e Canadá, há cerca de 100 milhões de pessoas que regularmente caminham todos os meses, duas ou três vezes com a família ou sozinhos”.
Desta forma, continua, este “é um mercado turístico que não está dependente das condições meteorológicas, porque quem vai para a praia, quer calor, que vai para a caça quer os períodos da caça, mas quem caminha, caminha fora de época, tipicamente”, uma vez que “pode caminhar com chuva, pode caminhar com frio e então se estivermos a falar do frio do Alentejo, que sabemos que é intenso, pode ser um dia de frio com sol”. O que “é uma bênção para quem vem dos países nórdicos, ou do Canadá, ou de sítios onde não pode caminhar porque não tem essas condições”, explica.
Então “a Entidade Regional de Turismo, a partir de 2015, preparou toda uma estratégia que culminou agora em 2020 com a edição de 47 percursos pedestres, um por cada um dos concelhos do Alentejo”. Isto com o objetivo de que “sejam a semente que vai germinar para a constituição das redes municipais de percursos pedestres”, tornando assim o “Alentejo na mais bem organizada região europeia a nível do turismo de caminhadas”. Isto porque o Walking, explica, “é o único produto turístico transversal a todo o Alentejo”.
Sobre a adesão dos municípios a esta iniciativa, o coordenador do “TransAlentejo Walking Festival” esclarece que “aderiram 34 municípios”, tendo ficado “13 municípios de fora, por opção própria”, mas “todos eles têm uma rota estruturada no seu território, portanto, não estão fora da rede TransAlentejo, que foi feita, tem o painel de saída, estão a edição nos guias, mas não aderiram ao festival”.
Porém, esclarece, que com as eleições deste ano “houve alguma rotação democrática em alguns municípios, o que fez com que, talvez as novas equipas tivessem tido dificuldade em perceber a dinâmica”, acrescentando que “o festival até estava pensando para outubro e transportámo-lo para novembro precisamente para dar tempo, mas alguns municípios que mudaram as equipas não aderiram, outros que mudaram aderiram”. Ainda assim, nesta primeira edição “o grande esforço que a Entidade Regional de Turismo está a fazer é a sedimentação do conceito da estruturação de produto”.
Assim sendo, “este ano trabalhámos ao nível das autarquias”, mas “objetivo para o próximo ano é a multiplicação a nível das juntas de freguesia, que são 310 no Alentejo”. Nesse sentido, “já pedimos este ano a colaboração dos seus presidentes, para distribuírem os cartazes pelas freguesias”. Ao mesmo tempo, outro objetivo passa pela “complementaridade com o tecido económico, porque estamos a falar de um produto turístico de utilização por quem gosta de caminhar, mas a importância é que as pessoas durmam nos alojamentos turísticos, comam nos restaurantes, utilizem os táxis, os transferes, façam compras”, pois “o turismo é economia”.
No que diz respeito a esta oportunidade ainda por explorar, José Pedro Calheiros explica que “eu fundei há 20 anos uma empresa especializada em caminhadas e em 1996 fui apelidado, por muita gente, de alguma loucura”, pois questionava-se “quem é que vai pagar para caminhar?”, contudo “a nossa empresa tem tido um sucesso relativo, ao longo dos anos e somos uma referência no mundo das caminhadas”.
“Eu julgo que esta vontade de caminhar, de andar na natureza, de correr, já existia noutros países, portanto chegou cá um bocadinho mais tarde, esta ânsia para natureza e fazer exercício físico”, contudo “eu julgo que tem muito a ver com uma mudança típica do modelo profissional que nós vimos evoluir em Portugal”, explica. Uma vez que o país na década de 80 “ainda tinha muita força braçal, onde as pessoas passavam o dia no campo ou nas fábricas a fazer um grande esforço, portanto ao fim de semana queriam algum repouso”. Já nas décadas seguintes “as pessoas trabalharam mais agarradas aos computadores, nos escritórios, passaram a andar menos de bicicleta ou a pé para se deslocarem para o trabalho e passaram a andar de automóvel, portanto esse sedentarismo obrigou a um contraponto, que foi fazer exercício físico”, aponta.
Ao mesmo tempo que “os próprios cuidados de saúde e não os cuidados da doença”, promovidos por campanhas de prevenção médicas, “disseram, o senhor tem que caminhar, o diabético tem que fazer meia hora de caminhada todos os dias, o senhor tem peso a mais, deve controlar a alimentação, mas caminhe”, algo que levou as pessoas a caminhar mais, “umas caminham na cidade, outras caminham nas pistas de atletismo e depois há aquelas que aliam o exercício físico, o desporto, a outra coisa, que é o desafio do conhecimento”.
“Eu costumo dizer que quem caminha e quem caminha connosco tem que caminhar com os pés, mas também com a alma” e dessa forma “saber porque é que aquela anta, quem eram os povos que aqui viviam, o que é a estrada romana”, e conhecer os demais produtos culturais da região.