O projeto “Aplicação de Metodologias de Inteligência Artificial e Processamento de Linguagem Natural no Serviço de Triagem, Aconselhamento e Encaminhamento do SNS 24”, em parceria com Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, E.P.E. (SPMS), é coordenado pelo investigador Paulo Quaresma e integrado por uma equipa multidisciplinar de investigadores da UÉ, do NOVA LINCS – Laboratório de Informática e Ciências da Computação e do Centro de Investigação em Matemática e Aplicações (CIMA).
Como explica Paulo Quaresma, “numa primeira fase, foi necessário “identificar os algoritmos mais adequados para um determinado conjunto de sintomas, com ajuste para idade e sexo”. Para tal, foi desenvolvido “um pequeno protótipo, com base em apenas três meses de dados do SNS24, que demonstrou ter um desempenho muito positivo”.
O investigador avança que “até ao final do ano contamos ter uma aplicação que tenha a capacidade de sugerir o algoritmo clínico mais adequado a cada situação com uma precisão superior a 95%, reunindo condições para ser integrada na atual aplicação do SNS24. Esta integração, do ponto de vista técnico, é razoavelmente simples, mas requer um planeamento cuidado e uma implementação faseada e devidamente avaliada”. De qualquer forma, “e tendo em conta a atual situação de pandemia Covid-19 e a forte pressão sobre a linha SNS24, julgo que há condições para se iniciar este processo antes do final deste ano”.
Para desenvolvimento do SNS24 Scout a equipa está a aplicar técnicas de Processamento de Língua Natural (PLN) e de Aprendizagem Automática (ML-Machine Learning), desenvolvidas especificamente para a Língua Portuguesa, bem como a metodologias de representação de conhecimento. A metodologia é alicerçada em classificadores construídos com base em algoritmos de aprendizagem automática sobre um conjunto de dados anonimizados, obtidos a partir dos contactos para o SNS 24 em
2017, 2018 e 2019, dados que representam uma experiência acumulada superior a 2 milhões de casos.
Após a criação do modelo de predição, o sistema será implementado no Serviço de Triagem, Aconselhamento e Encaminhamento (TAE) do SNS 24, com caráter de suporte à decisão, auxiliando o enfermeiro a selecionar, em tempo real, o algoritmo clínico mais adequado.
Quanto aos resultados do projeto, o Professor do Departamento de Informática da UÉ mostra-se confiante “se se confirmar a nossa expectativa em termos da qualidade de desempenho, poderá vir a ser um importante sistema de apoio à decisão dos profissionais da Linha de atendimento do SNS24. Pretendemos conseguir diminuir mais do que 5% no tempo médio de cada chamada telefónica, mantendo ou mesmo aumentando a qualidade do serviço prestado. Uma diminuição de 5% no tempo de atendimento (sem compromisso da qualidade) permitirá obter um ganho anual de 350.000 minutos, o que permite realizar mais 50.000 atendimentos.
A avaliação deste impacto será efetuada por análises comparativas do número e percentagem de chamadas telefónicas em que há alteração do algoritmo inicialmente selecionado e da duração média das chamadas telefónicas.
Após a implementação, o que se segue?
Numa segunda fase do projeto, está prevista uma articulação mais direta com os SPMS e com a DGS, “através da partilha dos resultados da análise profunda de dados (“data analytics”) e que poderá vir a dar indicações importantes sobre os diversos algoritmos clínicos e o seu desempenho e adequação”.
Os investigadores da UÉ pretendem, ainda, criar uma ferramenta de apoio ao processo de otimização do desenho dos algoritmos clínicos e respetivos encaminhamentos. Acrescentando aos dados já referidos o encaminhamento e a sua adequação, e ainda os diagnósticos estabelecidos ao nível hospitalar, será possível avaliar, entre outros, tal como esclarece Paulo Quaresma, “o desempenho clínico de cada encaminhamento, quando classificado em termos de segurança e capacidade discriminatória, a previsão do impacto de potenciais alterações aos algoritmos em termos de segurança e desempenho ou a previsão dos diagnósticos efetuados a nível hospitalar para cada algoritmo ou conjunto de sintomas”.
Com este tipo de análise “será possível detetar eventuais padrões anómalos e permitir a tomada de decisões, por parte da Direção-Geral de Saúde, mais informadas e suportadas por «real world data»”, ou seja, através de dados derivados de várias fontes associadas a resultados em uma população heterogénea de pacientes em ambiente real, ensaios clínicos e estudos de coorte observacionais, entre outros, esclarece o investigador.
Qual o papel da Inteligência Artificial?
Questionado sobre o papel que a inteligência artificial assumirá no futuro, o investigador não hesita em afirmar que esta “já tem um forte impacto em grande parte das áreas do nosso dia-a-dia e essa tendência vai continuar a aumentar de uma forma exponencial nos próximos tempos”. Na sua opinião “não há nenhuma atividade que não esteja a recorrer a metodologias de inteligência artificial para melhorar o seu desempenho, desde a agricultura aos serviços, passando pela indústria”. No entanto “há questões éticas e legais a resolver; não devemos ver a relação homem-máquina como uma ameaça, mas sim como uma relação de cooperação, em que a criação de agentes cada vez mais inteligentes vai permitir libertarmo-nos de algumas tarefas e focarmo-nos no desenvolvimento de uma melhor e mais justa sociedade.”